Para ampliar a discussão sobre o
projeto de Lei que transfere a gestão do Hospital Regional de Iguatu
para a entidade religiosa São Camilo, o advogado e professor
universitário Mário Leal, concedeu entrevista ao Jornal A Praça, onde faz uma análise técnica e jurídica do projeto.
A Praça - O que o senhor acha da transferência de gestão do Hospital Regional de Iguatu para a instituição religiosa São Camilo?
A Praça - O que o senhor acha da transferência de gestão do Hospital Regional de Iguatu para a instituição religiosa São Camilo?
Mário Leal - Teoricamente sou a favor. Há 20 anos o Brasil
vivenciava um verdadeiro caos econômico com uma inflação beirando os
100% ao mês, totalmente dependente do Fundo Monetário Internacional com
uma das maiores dívidas externas do mundo, atingindo aproximadamente 250
bilhões de dólares. Era preciso coragem e vontade política para
modernizar o Estado. Quebra a enlaça da estatização. Transferir a gestão
do negócio para a iniciativa privada, muito mais eficiente do que o
estorvo da burocracia estatal. Naquela época o mundo tomava conhecimento
de que o gerenciamento dos meios de produção praticados pelo Estado se
tornara ineficiente. Desmoronava-se o Muro de Berlim e a Rússia
reconhecia que o modelo de economia praticado pelo lado de lá era muito
mais eficiente. Aqui no Brasil vivíamos um misto de capitalismo e
comunismo, pois a economia era fechada para o mundo. Era proibido
importar quase tudo. Por outro lado, considerável fatia dos meios de
produção era gerenciado pelo Estado. Precisávamos urgentemente de um
choque de modernidade. Estabilizar a inflação, privatizar e abrir os
portos para as importações, a exemplo do que fez D. João VI no início do
século XIX. Em 27 de fevereiro de 1994, no governo de Itamar Franco, o
ministro da economia Fernando Henrique Cardoso implantou o Plano Real
com o objetivo de estabilizar a economia e deu continuidade as
privatizações de grandes empresas estatais. A partir dali o Brasil
prosperou. Pagamos a dívida externa e hoje possuimos reservas em torno
de 300 bilhões de dólares. Passamos de país subdesenvolvido para uma das
maiores economias do mundo. Na verdade o grande beneficiário da
modernização do estado brasileiro foi o povo. O pobre, principalmente,
que era o mais atingido. Possuir telefone naquela época era privilégio
apenas dos arremediados. Muito embora o Brasil seja hoje um país
diferente, muito ainda tem que ser feito. Precisamos dar um novo choque
de modernidade na saúde e na educação, que apesar dos avanços ainda
deixam muito a desejar.
Jornal A Praça - O que isso tem a ver com a transferência de gestão do HRI?
Jornal A Praça - O que isso tem a ver com a transferência de gestão do HRI?
Mário Leal - Vou chegar lá. Em tese, a transferência de gestão do
HRI para o Instituto São Camilo, tem muito a ver com o que aconteceu no
início da década de 90, pois também representa uma ruptura, uma mudança
radical, uma transformação em busca de melhoras. Evidentemente, é comum
que a alteração de costumes, provoque reações, principalmente naqueles
que estão indiretamente ligados ao negócio. É normal que as
irresignações também estejam acontecendo aqui em Iguatu com o projeto de
transferência de gestão do HRI. Nesse caso específico, precisamos
deixar de lado os interesses individuais para fixarmos as nossas
atenções exclusivamente no princípio da supremacia do interre público.
Esse o cerne da questão. Isso é o que deve ser discutido: o interesse
público como proteção da coletividade. Se isso estiver realmente
acontecendo, a transferência deve ser recebida com regozijo. Na verdade
não podemos confundir interesse público com interesse individual, ou
simplesmente com o interesse do agente público, pois este não pode se
prevalecer de uma conduta individual que satisfaça apenas a sua própria
instância em detrimento da coletividade. É bom que se diga que essa
transferência vem ocorrendo em várias partes do País, tanto em nível
estadual como municipal e aqui no estado do Ceará diversos municípios já
aderiram a essa cessão. Desta forma, os serviços de saúde pública à
população brasileira estão sendo abdicados para a iniciativa privada há
mais de 10 anos, sob o argumento de que a transferência de gestão para o
empreendimento social sem fins lucrativos proporciona melhores serviços
de saúde, maior autonomia gerencial, aumento da eficiência e de
qualidade dos serviços, atendendo, assim, melhor ao cidadão com custos
menores.
Jornal A Praça - Muito tem se discutido sobre o aspecto da legalidade da transferência de gestão essa transparência é legal?
Jornal A Praça - Muito tem se discutido sobre o aspecto da legalidade da transferência de gestão essa transparência é legal?
Mário Leal - A princípio, não vislumbro nenhuma ilegalidade na
transferência de gestão do HRI, desde que exista Lei Municipal
específica para este fim, uma vez que, no aspecto federativo a cessão
encontra-se regulamentada desde 06 de novembro de 1997, quando da
discussão do Plano Diretor de Reforma do Estado com a edição da Medida
Provisória 1591-1 que estabelece critérios para a transferência de
gestão à entidade que, uma vez autorizada, estivesse apta a ser parceira
do Estado, na condução da coisa pública, notadamente na prestação de
serviços de saúde pública e educação. Tal medida provisória foi
posteriormente transformada na Lei Nº 9.637, d 15 de maio de 1998. Com
efeito, o art. 1º da mencionada Lei assim preceitua: Art. 1º: O poder
executivo poderá qualificar como organizações sociais pessoas jurídicas
de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam
dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento
tecnológico, à proteção e preservação do meio ambinete, à cultura e à
saúde, atendidos aos requisitos previstos nesta Lei. Assim, com base no
esboço jurídico acima delineado, vários Estados e Municípios da
Federação passaram a transferir os serviços de saúde de unidades
hospitalares públicas para entidades filantrópicas sem fins lucrativos
sob o contexto de modernização do serviço, melhor eficiência gerencial e
melhor assistência a coletividade. Diante do que foi dito, não enxergo
ilegalidade na transfer~encia de gestão do Hospital regional de Iguatu
para a Ordem Camiliana.
Jornal A Praça - Por que essa transferência de gestão para a instituição religiosa São Camilo?
Jornal A Praça - Por que essa transferência de gestão para a instituição religiosa São Camilo?
Mário Leal - Creio que pelo respaldo e reminiscência da Província
Camiliana Brasileira da Ordem dos Ministros dos Enfermos - Padres e
Irmão Camilianos, sem sombra de dúvida, a mais renomada instituição do
Brasil voltada para o gerenciamento de atividades públicas ligadas a
educação e saúde. Conheço a instituição há vários anos, desde os meus
tempos de seminário quando Missionários da Ordem Camiliana desenvolviam
projetos sociais na região do Cariri. Com efeito, a União Social
Camiliana Brasileira, instituição sem fins lucrativos tem respaldo
internacional e possui como lema promover o desenvolvimento do ser
humano por meio da educação e da saúde e foi fundada na cidade de Santos
em meados do século passado, para socorrer os pobres da Baixada
Santista até transferir sua sede em 1978 para a capital de São Paulo,
quando iniciou suas atividades acadêmicas educacionais, gerenciando
cursos na área da saúde, com o objetivo de suprir os hospitais com
recursos humanos qualificados. Desta forma, não se trata de uma
instituição privada "qualquer". a entidade tem história e objetivos
específicos formados nos ideais do fundador da Ordem Camiliana: São
Camilo de Léllis, que tinha como lema: "servir com amor evangélico,
preferencialmente aos mais pobres. Se isso vier a acontecer aqui em
Iguatu, ou seja, a transferência da gestão do HRI para a Ordem
Camiliana, de uma coisa, tenho absoluta certeza: "pior do que tá não
fica".
Iguatu Notícias
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