segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Novas formas de vender a produção levam agricultores familiares a movimentar R$ 300 mil no Ceará

Sem as tradicionais feiras livres e com a logística de distribuição dos produtos sendo uma das principais dificuldades do trabalho, os agricultores familiares cearenses só puderam contar com a expertise do trabalho em equipe para enfrentar os efeitos da crise que a pandemia trouxe para eles desde abril deste ano. Orientados por iniciativas diversas, famílias de produtores rurais conseguiram reaver a confiança e movimentaram mais de R$ 300 mil.

"No começo da pandemia foi muito difícil, eu olhava de um lado e para o outro em busca de uma solução, pois a gente tinha dívidas para pagar, pão na mesa para colocar, mas não tinha dinheiro", relembra a agricultora Joana Peixoto, de 31 anos.

Ela e o marido, Gabriel Capistrano, conduzem a produção familiar na Serra de Baturité, onde o trabalho proveu a vida delas de duas formas: trazendo o sustento da casa e também resguardando a saúde mental dela em meio à pandemia. "Nesse momento, foi uma das melhores terapias, porque eu já tive problema de depressão e a plantação me ajudou a superar a doença. Plantar me ajudou a superar tudo, inclusive o medo nessa pandemia", revela sobre o trabalho que desempenha desde o 13 anos, quando ajudava os pais, e que agora conta com o apoio da Muda Meu Mundo.

A startup cearense criou uma plataforma para conectar pequenos produtores ao varejo e tomou força ao longo da pandemia.

De acordo com a CEO da empresa, Priscila Veras, a ferramenta permite que os pequenos produtores forneçam produtos diretamente aos supermercados. A iniciativa contou com a participação de mais de 200 agricultores de todo o Estado, dos quais 50 são produtores fixos para o varejo.

Recursos

A CEO da startup contabiliza que, entre janeiro e agosto deste ano, a renda dos agricultores cresceu e o projeto movimentou mais de R$ 300 mil com a agricultura familiar. A renda média mensal de cada agricultor gira em torno de R$ 3 mil, sendo um lucro variável a cada mês.

"Nesse período de pandemia, a renda deles só fez aumentar. A gente está gerando renda recorrente pro agricultor, então, todo mês, ele sabe o quanto vai ganhar. Eles recebem o justo pelo produto que vendem", destaca, adiantando que já há planos de levar a iniciativa que reúne cerca de 200 agricultores no raio de 200 km de Fortaleza para outros estados.

"O projeto foi a nossa salvação, significou muito, porque graças a ele, a gente não ficou sem renda. Continuamos a vender os produtos e ainda mais conseguimos ter pedidos ainda maiores", comenta a agricultora.

Fernanda e o marido, César Farias, largaram o trabalho de carteira assinada há oito anos para viver dos "frutos de seu terreno". Ela trabalhava em uma escola pública e o esposa, em uma granja. Com a pandemia, eles tiveram uma certeza ainda maior de que estavam no caminho certo.

"Com o projeto, a gente teve uma expectativa maior de que fez o certo, de trabalhar com o nosso terreno, nos deu uma reanimada. Durante a pandemia, a gente estava sempre bem, não tivemos a preocupação de ficar sem renda, pois o trabalho não parava, sempre chegava pedidos maiores", pontua.

A agricultora conta que na pandemia a demanda pelos produtos apresentou um crescimento de 80% em relação ao período anterior, em que só vendiam em feiras livres. Ela relembra que muitas vezes, ia para as feiras e voltava com 50% da mercadoria, porque não se tinha uma "saída boa" dos produtos.

Feira virtual

No Centro de Estudos do Trabalho e Assessoria ao Trabalhador (Cetra), pelo qual mais de 8 mil famílias de agricultores, quilombolas e indígenas têm orientação, a pandemia também forçou a criação de novas maneiras para auxiliar os produtores locais que comercializavam seus produtos na feira agroecológica de Itapipoca, que já acontece há mais de 15 anos. A estratégia adotada consistiu na criação de uma feira virtual.

Para Gleyciane Teles, coordenadora territorial do Cetra de Itapipoca, apesar de ainda não alcançar o volume de vendas da feira presencial, o resultado foi satisfatório. "Nesse período de pandemia, a feira virtual foi uma estratégia muito boa, porque eles puderam comercializar uma parte da produção", avalia.

Até o momento, a iniciativa conta com a adesão de 15 agricultores. Além disso, com a divulgação dos produtos nas redes sociais, a feira conseguiu atrair a atenção de mais consumidores que não tinham o hábito de adquirir produtos na feira presencial.

Aumento da produção

Com o aumento da procura devido à feira virtual, a agricultora Rojany Santos, que faz parte do grupo óleo de coco do Assentamento Maceió, viu os lucros e a produção crescerem no período da pandemia.

Ela conta que antes do período, o grupo lucrava cerca de R$ 300 por mês com a venda de produtos. No mês de julho, os lucros foram acima do dobro, indo a R$ 800.

"No começo da pandemia foi bem tenso. A gente não sabia como ia vender o produto, pois a feira era o local onde mais vendia. Então, a gente começou a divulgar os produtos no WhatsApp, Instagram e aí o Cetra também fez a feira online e a gente começou a vender mais, bem mais", conta a agricultora. Rojany relembra ainda que antes da pandemia, o grupo se reunia a cada 15 dias para a fabricação dos produtos. Hoje, o encontro é semanal para conseguir suprir a maior demanda.

Perdas

Apesar de a feira online ter auxiliado alguns agricultores, outros não conseguiram inserir seus produtos no modelo. A agricultora Graça Patrício foi uma das que perdeu a plantação de jerimum e feijão verde.

Graça revela que, sem as feiras, ela chegou a obter perda de R$300 a R$400 por semana. "A gente perdeu muita fruta e muitos legumes com a suspensão das feiras. Eu tinha, em média, um apurado de R$ 300 a R$ 400 por semana, desde o começo da pandemia estou sem esse apurado. O único produto que tenho entregado é o ovo e, estou apurando em torno de R$ 80 a R$90 por semana apenas", diz Graça.

Do Chão Maciço

Produtores locais de Baturité em parceira com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), lançaram uma plataforma de WhatsApp Business, em que 120 agricultores da região são beneficiados com a venda direta para os consumidores.

O projeto iniciou em maio, como forma de atenuar os impactos devido a pandemia. A articuladora do Sebrae em Baturité, Fabiana Gizele, pontua que até agora, aos produtores tiveram uma lucratividade em cerca de 30% em relação ao período pré-pandemia.

Marli Oliveira, agricultora e participante da Cooperativa da Agricultura Familiar de Ocara (COOAF), avalia que o projeto tem contribuído muito na renda e no incremento de novos consumidores. "Antes a gente só atendia escolas. Com o delivery, tivemos o prazer de atender uma nova clientela que aprecia os produtos da terra, livres de agrotóxicos produzido por agricultores".

O projeto atende a população de Baturité e a cada 15 dias realiza entregas em Fortaleza também.

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