quarta-feira, 4 de março de 2020

Imposição da carteira de trabalho digital pode elevar informalidade

A versão digital da Carteira do Trabalho e Previdência Social (CTPS) passou a ser a única opção a ser emitida desde segunda-feira (2). Os trabalhadores que solicitarem o documento ou pedirem a segunda via não mais receberão a versão física da carteira, de forma que o acompanhamento das anotações se dará de forma eletrônica. Para especialista, a medida pode elevar a informalidade entre as camadas mais pobres da população.

O professor do curso de Economia Ecológica da Universidade Federal do Ceará (UFC), Aécio Alves Oliveira, lembra que ainda há uma parte significativa da população que não possui acesso à internet. Para ele, a medida tem um caráter discriminatório com os mais pobres. “Como a pessoa vai ter um celular para acompanhar se ela está desempregada, sendo de baixa renda? Isso vai agravar o problema da informalidade”, afirma.

Segundo os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) disponíveis, em cerca de 2,8% dos domicílios no Ceará não tinham internet em 2017. As principais justificativas, segundo o levantamento, eram a indisponibilidade do serviço de acesso à internet na área do domicílio e o alto preço do equipamento necessário para o acesso.

Oliveira detalha que, por não ter como acessar a carteira de trabalho, os trabalhadores irão aceitar com mais facilidade posto de trabalho informais. “As pessoas não têm condições de ter internet em casa e vão se sujeitar a um mercado de trabalho totalmente livre, sem controle, sem fiscalização. Até porque o próprio Ministério do Trabalho, que deveria fazer esse acompanhamento, foi extinto”, ressalta.

Mudanças

O professor alerta que as questões sociais são esquecidas em processos de modernização. “A tecnologia tem essa aparência, ela transmite que está melhorando tudo, mas as pessoas não atentam para outros impactos, não estão preocupadas com o que pode acontecer”, avalia.

A situação também preocupa o supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeco-nômicos (Dieese), Reginaldo Aguiar. “Temos um País ainda cheio de analfabetos, sem acesso básico à informática. E na outra ponta, um processo de modernização”, afirma.

“Ninguém tem nada contra tecnologia ou facilidades, até porque permite o trabalhador ter a carteira sem sair de casa, mas tem que ser garantido acesso às pessoas que tem dificuldade com relação à informática, que tem a visão prejudicada, etc”, acrescenta.

Adaptação

O titular da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Ceará, Fábio Zech, argumenta que a digitalização amplia o acesso ao documento por permitir a emissão em qualquer lugar, independentemente de haver agência da instituição no local ou não. “Basta ter internet. Nós também estamos recebendo os trabalhadores nos postos para autoatendimento guiado. Servidores irão auxiliar os trabalhadores que não têm internet em casa ou com dificuldades de habilitar o documento”.

Segundo Zech, todas as agências da Superintendência no Ceará terão a estrutura de autoatendimento guiado. Para os municípios que não possuem agência, ele afirma que no próximo dia 9 se reunirá com as prefeituras para firmar convênio. “Para que toda Prefeitura tenha um posto de autoatendimento guiado. E não irá auxiliar só na carteira digital, mas também no seguro desemprego digital”.

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