sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Cearenses na Bolsa quase triplicam em um ano e investem R$ 2,4 bi

Primeiro foram as corretoras independentes que reduziram taxas para atrair investidores do mercado de ações que, até então, aplicavam seus recursos majoritariamente nos grandes bancos. Depois, foram os bancos tradicionais que, para estancar a fuga de clientes, passaram a oferecer melhores condições para operar na Bolsa. E agora, a própria B3 (antiga Bovespa) estuda reduzir as tarifas impostas às corretoras para levar mais pessoas físicas ao mercado de capitais.

Segundo o presidente da B3, Gilson Finkelsztain, as discussões ainda estão em estágios preliminares, mas a companhia não descarta possíveis isenções tarifárias e redução das atuais taxas cobradas. O objetivo é evitar o repasse dessas cobranças, diminuindo o custo de alocação para os investidores e, assim, atrair mais pessoas físicas para o mercado de capitais.

"Essa é uma boa notícia que vem em um bom momento, especialmente neste período que estamos atravessando, de migração dos investidores da renda fixa para a renda variável", diz o economista Ricardo Eleutério, professor de Mercado de Capitais. "Com a queda das taxas de juros, o retorno das aplicações em renda fixa ficou muito baixo e essa possível redução de tarifas irá melhorar a rentabilidade do investidor em ações. Então, observando esse fluxo, isso é um estímulo adicional para o investidor brasileiro se dirigir à Bolsa".

Nos últimos 12 meses, desde novembro de 2018, o número de cearenses na Bolsa quase triplicou, passando de 10,8 mil investidores para 28,5 mil, ritmo superior ao verificado no País no mesmo período. Ao todo, o investimento dos cearenses somava R$ 2,4 bilhões no mês passado. No Brasil, o número de investidores pessoas físicas dobrou, passando de 789,6 mil para 1,5 milhão. Porém, a participação de cearenses no mercado ainda é pequena (somente 1,79% do total).

Eleutério ressalta, no entanto, que a baixa participação do investidor cearense pode representar um grande potencial de crescimento para o segmento do mercado local. "O número de investidores no Ceará vem crescendo a taxas maiores do que no País. Tivemos uma adesão muito forte no Estado, também estimulada pela presença de empresas cearenses listadas em bolsa, como a M. Dias Branco e Hapvida, na B3; e a Arco Educação na Nasdaq (bolsa americana de empresas de tecnologia)", aponta.

Incentivos

Um dos incentivos tarifários já estudados pela B3 é a cobrança da tarifa fixa na conta depositária de corretoras, que começa em R$ 9 mensais. Entretanto, embora a tendência seja que a isenção de taxas aos investidores se amplie no mercado, caberá a cada plataforma aderir ou não ao movimento. Para a economista Juliana Miranda, sócia da Acqua Investimentos (escritório de agentes autônomos vinculados à XP) em Fortaleza, a redução de tarifas contribui para que pessoas, mesmo com pequeno patrimônio, possam investir em bolsa.

"Muitos ainda acreditam que é preciso ser um investidor de grande porte para adquirir ações. Medidas nesse sentido vêm democratizar ainda mais o acesso das pessoas ao mercado de renda variável", diz ela. "Além disso, contribui para a valorização das empresas brasileiras".

Mesmo com a presença de corretoras que não cobram taxas de corretagem, por exemplo, Miranda acredita que, pelo crescimento da base de investidores, haverá espaço para todos os tipos de serviços.

"Algumas corretoras ainda vão cobrar taxas para poder prestar assessoria aos clientes, bem como para aqueles que estão entrando no mercado. Já os que têm mais experiência, que operam sozinhos, esses irão para corretoras que oferecem taxa zero. De todo modo, essa redução de custos para investir deverá aumentar muito o número de investidores no País", diz Miranda.

Internacionais

Sobre a competição com as bolsas internacionais, diante da preferência que algumas companhias brasileiras têm demonstrado por abrir capital no exterior, como no caso da Arco Educação e, mais recentemente, da XP Investimentos, o presidente da B3 afirmou que a instituição já busca fomentar o maior acesso do investidor a ativos fora do País.

Segundo Finkelsztain, a competição com bolsas internacionais preocupa, e a ideia é facilitar as negociações de empresas estrangeiras na própria B3, por meio de certificados de depósitos que permitem o investimento em ações estrangeiras (BDRs).

Sobre as projeções de mercado para as novas ofertas públicas de ações (IPOs) e emissões secundárias (follow ons) em 2020, o presidente da B3 afirma que a projeção é que essas ofertas alcancem um número semelhante ao observado ao longo de 2019, de 20 a 30 operações.

"Temos muita convicção no crescimento, mas precisamos ampliar o hall de ativos disponíveis. Falamos de BDRs, fundos imobiliários e créditos, além de diminuir o ticket médio do IPO para possibilitar a abertura de capital por empresas médias. Tudo isso conta", aponta Finkelsztain.

Atualmente, o ticket médio da abertura de capital no Brasil é quatro vezes o valor de um IPO no exterior. Na avaliação do presidente da B3, a medida de flexibilização da Bolsa para IPOs de empresas médias também aproximará a Bolsa brasileira das fintechs (empresas de tecnologia voltadas às finanças).

CVM quer facilitar portabilidade

A exemplo do que os bancos estão fazendo com o "open banking" (sistema de compartilhamento de dados de clientes entre instituições financeiras), a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) começa a implantar no mercado de capitais brasileiro o "open broker". A ideia é desenvolver um cadastro único de investidores e possibilitar, por exemplo, a portabilidade de dados cadastrais e custódia de ativos, com menor burocracia.

Assim como ocorre no "open banking", a premissa básica do "open broker" é que os dados pertencem ao usuário, que deverá permitir expressamente sua transmissão a terceiros. Segundo estimativa da CVM, somente para cumprir regras associadas à gestão cadastral, gestão de 'suitability' (adequação ao perfil do investidor) e de monitoramento de pessoas expostas politicamente (PEPs), os custos anuais dos participantes do mercado chegam a R$ 13,1 milhões, sem contar os custos em relação à eficiência operacional.

"Para o investidor, o principal benefício é o ganho de autonomia. Desburocratizar é a palavra chave", disse Bruno Luna, chefe da Assessoria de Análise Econômica e Gestão de Riscos (ASA) da CVM, responsável pelo estudo. Em contrapartida, para as prestadoras de serviço do mercado, a tendência é que o "open broker" gere redução de custos e de riscos.

A proposta da CVM é para que se crie uma rede privada de blockchain para compartilhamento desses dados entre corretoras. "Os indivíduos dialogariam cada um com sua corretora e elas trocariam informações nessa rede privada", disse o analista da ASA, Rafael Hotz. "Em paralelo ao movimento do 'open banking', a CVM quer ir na direção do 'open broker'. Cada um (CVM e BC) no seu quadrado regulatório, conversando quando necessário".

Diário do Nordeste

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