Mal estávamos comemorando a implantação da Lei da Ficha Limpa nas
eleições e sua vigência já a partir do pleito de outubro, e a politicada
safada do Brasil encontrou um “jeitinho” de melar o jogo. O pontapé
inicial foi dado pelo Tribunal Superior Eleitoral, que no início de
março aprovou uma resolução tornando inelegíveis todos os candidatos que
tiveram suas contas de campanha em eleições anteriores reprovadas, algo
que há muito tempo deixou de ser exceção e passou a ser regra no país
da politicagem rasa e medíocre. Em números rápidos, a ministra do TSE,
Nancy Andrighi, afirmou que há 21 mil candidatos com contas reprovadas
e, portanto, inelegíveis a partir da resolução.
Mas o que uma coisa tem a ver com a outra? Como a corretíssima decisão
do TSE pode afetar – e derrubar – a vigência da Ficha Limpa nas eleições
de outubro? A dinâmica é bastante simples e creio, inclusive, ter sido
calculada. Imediatamente após a decisão dos ministros do Tribunal
Superior Eleitoral, uma junta de 18 partidos políticos – que vão de PT a
PSDB, do DEM ao PCdoB – protocolaram recursos no Supremo Tribunal
Federal para questionar constitucionalmente a decisão da corte
eleitoral. Segundo eles, a decisão não pode entrar em vigor agora e só
teria valor a partir das eleições de 2014.
Eis que, novamente, o STF é colocado na berlinda, obrigado a tomar as
decisões mais difíceis e polêmicas que os vagabundos safados do
Congresso Nacional se recusam a assumir. Caso o Supremo não julgue o
recurso dos partidos até junho, a Justiça Eleitoral será inundada por
liminares exigindo a permanência dos candidatos com contas reprovadas no
pleito de outubro. E, caso sejam eleitos, veremos um festival de
disputas pela manutenção e derrubada de prefeitos e vereadores nos mais
de cinco mil municípios brasileiros. Será uma tragédia para as
administrações.
Por outro lado, se o STF julgar os recursos a tempo e decidir pela
legitimidade dos pedidos dos partidos políticos, estará aberta uma
brecha irreparável para derrubar a Lei da Ficha Limpa nestas eleições.
Tanto a lei quanto a resolução tem méritos semelhantes: visam banir da
vida pública os larápios, os bandidos, os políticos delinquentes. Por
que, constitucionalmente, uma pode ter vigência desde já e a outra não?
Como uma e outra poderão ter julgamentos diferentes, se embasadas nos
mesmos preceitos legais que regem a elegibilidade de um cidadão?
Vamos assistir uma avalanche de processos, recursos e pedidos de liminar
na Justiça, permitindo que os “fichas-sujas” tenham suas candidaturas
garantidas em outubro. Isso sem falar que os mais renomados juristas e
especialistas eleitorais não chegaram a uma decisão pacífica sobre o
assunto. Apesar de contar com o apoio do Ministério Público,
especialistas acreditam que a decisão do TSE é arbitrária. Mesmo sendo
um poder híbrido – com poder normativo e de regulação eleitoral – o TSE
acabou invadindo uma seara do Congresso Nacional, uma reserva legal do
Poder Legislativo. Terá a Suprema Corte peito para ordenar essa bagunça
jurídica?
Com o Poder Legislativo cada vez mais fraco e desqualificado, que só
está servindo de cabide de empregos para uma corja de bandidos
engravatados e seus diletos apaniguados, restará ao Poder Judiciário –
em especial o STF – decidir os destinos políticos do Brasil. Agora é
ajoelhar no milho e rogar aos céus para que os onze ministros do Supremo
tenham a sabedoria e a integridade de manter a vigência da Lei da Ficha
Limpa e da resolução do TSE. Caso contrário, a bandalheira seguirá
solta, comemorando a desmoralização do país e suas mais torpes mazelas.
Hélder Caldeira
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